Voltar para existir, existir para resistir…

Editorial*

Em 2008, dois estudantes de graduação do Instituto de Artes da UFRGS lançaram por conta própria uma revista online independente dedicada à crítica e à reflexão contemporânea sobre as artes visuais, tendo como um dos seus principais objetivos ser uma ponte entre o institucional e o não institucional. A inquietação que motivou àqueles surgiu do questionamento: “que ação é possível do lugar de onde estamos?”

Passaram-se mais de dez anos do último número daquela primeira etapa da Panorama Crítico. Aqueles estudantes que coordenaram e outros que se juntaram e contribuíram com a revista ganharam peso, perderam cabelo, mas também se formaram e se profissionalizaram. Muitos fizeram pós-graduação, desenvolveram pesquisas e alguns viraram professores. Mas além deles, o ambiente cultural, social e político do país também mudou, e não necessariamente para melhor.

A cultura em geral e a arte contemporânea passaram a ser gradualmente vigiadas e atacadas por parte de um reacionarismo emergente autodenominado “conservador”. Sob a bandeira dos bons costumes, um verdadeiro balaio de fanáticos e oportunistas encontrou nos artistas e nas exposições um alvo de relativamente pouco poder de reação que lhes renderia, ao mesmo tempo, visibilidade e publicidade. Mas isso, quem diria naquela época, foi apenas o prelúdio da insanidade.

Pastas e instituições foram tomadas por uma política do retrocesso em nome de uma agenda de “costumes”, que está marcada pelo assédio e a perseguição. Então, acompanhamos perplexos o fechamento do Ministério da Cultura, o empossamento de pessoas despreparadas para cargos chave na cultura e em instituições como a fundação Zumbi dos Palmares e a FUNARTE, o policiamento ideológico e a adoção de atos censórios – ainda que não oficializados na forma de lei – quanto à aprovação de projetos e financiamentos. Tudo isso sendo confirmado pelo descaso com a memória histórica e cultural nas chamas que consumiram museus e acervos.

Como dissemos em nossa apresentação, o contemporâneo na arte se expressa nas diferentes maneiras em que ela se conecta com os diferentes planos do mundo e o cotidiano. E nestes tempos sombrios, de cerceamento, sentimos a necessidade de novamente nos perguntar o que podemos fazer do nosso lugar. A resposta foi “voltar!”. Não apenas para preencher lacunas e criar espaços de pensamento e de trocas, mas principalmente, para estar, existir. Pois estar e existir é um gesto de resistência para os tempos atuais.

Sejam bem-vindes de volta e boa leitura!


  1. por Rodrigo Montero, Alexandre Nicolodi e Júlio César da Rosa Herbstrith.